8 de jun. de 2009

Matança no Peru. Indígenas protestavam contra o Tratado do Livre Comércio

O número de mortes subiu para mais de cinqüenta após a violenta repressão policial contra um piquete de nativos amazônicos que bloquearam uma rodovia na selva em protesto contra uma série de leis que implementam o Tratado do Livre Comércio (TLC) com os Estados Unidos e que afetam as suas comunidades. A reportagem é de Carlos Noriega e publicada pelo Página/12, 07-06-2009. A tradução é do Cepat.
Fonte: UNISINOS


O governo confirmou a morte de 22 policiais, enquanto os indígenas mortos seriam, segundo diferentes versões vindas da região do massacre, mas de trinta, ainda que o governo apenas tenha admitido a existência de nove vítimas civis. Nesse sábado se reconheceu que nove policiais morreram durante a ocupação de uma estação da empresa petrolífera estatal Petro Peru realizada na quinta por um grupo de indígenas.

Outros 22 policiais feito reféns foram liberados e sete permanecem desaparecidos. Os feridos são mais de 150 e os presos chegam a uma centena. O líder dos indígenas, Alberto Pizango, passou para a clandestinidade logo após a emissão de uma ordem de prisão. Especulou-se que teria viajado para Bolívia, mas dirigentes da organização indígena garantiram que Pizango, acusado de rebelição e incitação da violência, permanecia em Lima. Em Bagua, lugar da matança, se adotou um toque de recolher entre as três da tarde e as seis da manhã. As comunidades indígenas denunciaram o governo de Alan García à Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Os indígenas amazônicos, que chegam a 350 mil, se levantaram contra o governo faz dois meses exigindo a derrogação de novas leis ditadas pelo governo em março em cumprimento a implementação do TLC com os Estados Unidos. Estas leis facilitam a entrada na Amazonia de transnacionais petroleiras e mineradoras e de empresas dedicadas a produção de biocombustíveis. As comunidades nativas reagiram contra o pacote legal por considerar que afetam os direitos sobre as suas terras e ameaçam o ecossistema da Amazonia, onde vivem.

Os indígenas acusam o governo de ter se decidido por essas leis sem consultas, como exige o Convênio 169 da OIT, que obriga às comunidades nativas serem consultadas antes da definição de uma norma legal que venha afetá-los. Esta omissão transforma as leis em inconstitucionais. O governo admitiu a omissão, mas insiste em manter a vigência das leis, apesar de uma comissão no Congresso e a Defensoria do Povo terem se pronunciado por sua inconstitucionalidade. O governo destaca que o não cumprimento dessas normas legais coloca em risco o TLC com os Estados Unidos e decidiu mantê-las a ferro e fogo. A negativa do governo em derrogar as leis tornou impossível o diálogo com os indígenas e o conflito foi crescendo até que se desencadeou o massacre, após o governo ordenar a polícia a repressão aos indígenas.

Se estas leis se mantém, em curto prazo, as terras amazônicas passarão para mãos das corporações petroleiras, mineradoras, de água, madeireiras, produtoras de bicombustíveis, e a médio prazo, a Amazônia estará destruída e as populações indígenas convertidas em proletárias. A luta contra estas leis, é uma luta pela sobrevivência das comunidades amazônicas e de sua cultura”, disse ao Página/12, Roger Rumrrill, um dos mais importantes pesquisadores da Amazonia peruana.

Página/12, conversou por telefone com Incam Santiac, líder indígena da etnia Awarun, no limite da zona fronteiriça com o Equador, que esteva presente na violenta repressão contra os indígenas na Curva do Diabo. “Nós estávamos dormindo na rodovia, quando a polícia nos atacou. Eram as cinco e meia da manhã. Primeiro, com gás lacrimogêneo e quando viram que não podiam nos tirar dali, começaram a disparar. Dispararam no corpo, para matar. Atiravam de um helicóptero e da mata. Um irmão caiu morto ao meu lado. Muitos caíram com as balas. O ataque durou até as duas da tarde, quando conseguimos regressar a Bagua. O governo mente quando nos acusa de ter atirado contra a polícia. Nós tínhamos apenas lanças e flechas. Os policiais devem ter sidos mortos por fogo cruzado. Até agora não nos deixam recolher os nossos irmãos mortos, que continuam estirados na rodovia. Há mais de cem desaparecidos”, relatou Santiac desde Bagua. O líder indígena anuncia que continuarão em sua luta contra o governo e as transnacionais que invadem as suas terras.

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